O horizonte proposto
J.-M. Nobre-Correia
Televisão : As caraterísticas que dominam os programas dos operadores de
telecomunicações são a mediocridade e a omnipresença da produção
estado-unidense…
Os portugueses admitem tudo. Suportam tudo. Habituam-se a tudo. Nomeadamente no que diz respeito aos operadores de telecomunicações. Operadores que praticam preços exageradamente elevados em comparação com os praticados em países europeus com poder de compra bastante mais elevado. Mas operadores que, em matéria de média tradicionais, propõem programas de televisão de uma inacreditável mediocridade.
Evidentemente,
não se trata aqui de evocar a mediocridade congenital das televisões portuguesas.
Mediocridade de que os operadores de telecomunicações não são responsáveis. Mas
sim da mediocridade global dos programas de origem estrangeira que são propostos
aos assinantes. Com numerosas televisões que emitem em línguas que só meia
dúzia de funcionários de embaixadas estrangeiras compreenderão. E umas tantas
televisões brasileiras cujo nível entra em concorrência direta com o das
portuguesas…
O
mais intolerável é o número de televisões de origem estado-unidense dos mais
diversos géneros. Quando as televisões espanholas, francesas, italianas,
britânicas, alemãs e até belgas, neerlandesas ou suíças são raras ou
inexistentes. Embora Portugal faça parte da mesma área cultural. Para não falar
de outros países de uma União Europeia de que Portugal até é membro. O que põe
em evidência o facto da União Europeia ser antes do mais um mercado comum e não
uma comunidade que partilha um projeto cultural, social e político.
Esta
ausência do projeto comunitário é particularmente posta em evidência pela
programação proposta em matéria de filmes. A predominância estado-unidense é
aterradora. Como se o cinema europeu não existisse ! Um cinema todavia mais
próximo das próprias realidades portuguesas. E um cinema que, como dizia Ingrid
Bergman numa entrevista ao jornal Le
Monde, tem sempre um pano de fundo social. Contrariamente ao cinema
estado-unidense que é globalmente divertimento, distração, “entertainment”. O
que convém perfeitamente aos paladinos da corrente ideológica que domina o
país…
Texto publicado no Diário de Notícias, Lisboa, 23 de agosto de 2014, p. 43.