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A mostrar mensagens de 2020

As ambições e as realidades

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  J.-M. Nobre-Correia Desde ontem, o  Diário de Notícias  é publicado de novo todos os dias. Mas que podemos esperar deste novo-velho jornal diário?… O  Diário de Notícias  voltou ontem às bancas. Todos os dias e não apenas uma vez por semana, como acontecia desde 30 de junho de 2018, primeiro aos domingos e depois aos sábados. Regozijem-nos com tal iniciativa. Que mais não seja porque são demasiado poucos os diários ditos “nacionais” publicados no país. Mas também porque não é desejável que os cidadãos disponham, como até agora, de um único diário dito “de referência”: em princípio, o pluralismo dos média e das abordagens da atualidade tem sempre algo de positivo. O problema é o de saber se o Global Media Group dotou o jornal das condições mínimas indispensáveis para poder ser um diário “de referência” publicado sete dias na semana. Isto é: um jornal que dispõe dos meios humanos, técnicos e financeiros necessários para produzir uma sólida e pertinente cobertura (quantitativa e qualita

Primeiro dia de exílio

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  J.-M. Nobre-Correia Faz hoje 54 anos que cheguei ao meu destino de exílio. Era já noite escura e chovia em Bruxelas. Não conhecia ninguém, ninguém estava à minha espera e o meu francês era então menos que rudimentar. Logo à chegada, a pega da minha mala tinha resolvido rebentar! Quem me ajudou a repará-la perguntou-me se eu era belga. Disse-lhe que não. E eu respondeu-me: “eu também não, sou flamengo”. Compreendi assim logo nos primeiros instantes que havia um problema em Bruxelas com que eu nem sequer tinha sonhado! Só, em terra desconhecida, a única referência de que dispunha era a de um artigo publicado duas semanas antes no  Diário de Lisboa  (Ver ilustração). Sob pretexto de “indicações sobre a vida dos estudantes latino-americanos na Bélgica”, eram nomeadamente mencionadas instituições dotadas de alojamentos e os respetivos endereços. O género típico de texto teoricamente desprovido de interesse num jornal português para leitores portugueses. Mas um texto que fornecia assim inf

Falemos de anjinhos!

  J.-M. Nobre-Correia Falemos de anjinhos! Não de anjinhos tão em voga nesta época do ano e que tanto ilustram os mais diversos impressos da época. Nem de anjinhos para embalar criancinhas com histórias para dormir de pé. Não!: de anjinhos com carteira de jornalista, o que, digam lá!, é bem mais curioso… Pois os ditos anjinhos com carteira de jornalista andam para aí a escrever e a dizer que “Marcelo” (sic) tem mais assinaturas para concorrer às próximas eleições para a presidência da República do que outros: “quase o dobro”. E também que o tal “Marcelo” vai gastar menos dinheiro na campanha do que outros: “quase metade”. Digam lá depois que esses detentores de carteira de jornalista não são uns anjinhos?! Falam todos, todos os dias do dito “Marcelo”, quando ele fala de tudo e de nada, quando ultrapassa regularmente os seus poderes constitucionais, quando intervém na vida governamental e se permite criticar uns e outros, quando vai beber um ginjinha e todas as demais situações caricata

Reparos a propósito de entrevistas

J.-M. Nobre-Correia Depois de ter visto quatro das cinco “entrevistas” da  RTP  1 no quadro da campanha para as eleições presidenciais (não vi a do candidato de Iniciativa Liberal), queria aqui fazer uns breves reparos. É uma evidência que a atitude do detentor da carteira de jornalista encarregado de tais emissões é totalmente inadmissível em termos de pura técnica jornalística. Mas é também absolutamente intolerável no que se refere ao respeito para com os “entrevistados” e também para com os espectadores, sobretudo numa televisão de “serviço público” paga pelos residentes neste país. Se houvesse uma verdadeira direção da informação na RTP, competente e a exercer o seu papel com a devida autoridade, o entrevistador teria sido cuidadosamente escolhido. E depois de escolhido, teria sido devidamente instruído pela dita direção da informação sobre a maneira de exercer a missão para que fora escolhido. É claro que, uma vez que exerceu com total incompetência e agressividade a primeira ent

A aleatoriedade de um sonho

J.-M. Nobre-Correia Eu sei!, eu sei!: quando vemos uma apresentadora discreta e não tendenciosa na formulação das suas intervenções, como é o caso desde ontem, somos muitos, muitos a sonhar que um dos apresentadores habituais tenha finalmente desaparecido dos ecrãs da RTP! Todos sabem de que apresentador se trata: daquele cheio de tiques faciais e gestuais, que faz frases com suspenses a propósito de tudo e de nada, e que acaba escandalosamente com um piscar do olho (que nenhuma televisão com um mínimo de exigência profissional deveria tolerar). Mas também daquele que agora faz revisionismo a propósito da trágica história dos nazis em relação às futuras vítimas do genocídio. E. aquele também que ainda há dias começou por introduzir uma entrevista com o principal responsável do programa de vacinação anti-covid, fazendo afirmações factualmente falsas. Dois casos recentes que teriam provocado um afastamento de qualquer televisão decente de um país europeu de velha democracia. Eu sei!, eu

A rádio parente pobre da televisão

J.-M. Nobre-Correia Conhecendo as situações das rádios e das televisões públicas na Europa, tenho, no entanto, tendência a considerar que a melhor situação para a rádio é a de uma instituição autónoma. Só assim ela depende do seu próprio orçamento, dos seus próprios equipamentos técnicos, do seu próprio pessoal, de modo a decidir da sua própria programação e do seu tratamento específico da informação. Quando ligada na mesma instituição à televisão, esta tem claramente tendência a absorver em seu proveito os meios teoricamente atribuídos à rádio. A entrevista de duas páginas do presidente da RTP no  Público  de hoje é significativa. Para além de considerações gerais sobre a instituição, tudo, absolutamente tudo o que é perguntado e respondido diz respeito à televisão e unicamente à televisão. Numa das respostas, o entrevistado faz referência a “todo o universo da rádio”, nestas cinco palavras apenas, sem nada explicitar sobre o assunto. E na penúltima pergunta é finalmente abordado “o f

Um género chamado entrevista

J.-M. Nobre-Correia O jornalismo não é uma ocupação em que se ganha a vida sem preocupações de formação ou de princípios técnicos a respeitar… Entrámos em campanha eleitoral! Estamos, pois, em tempo de entrevistas! E, dados os hábitos portugueses de consumo mediático, são as entrevistas em televisão que têm dominado as conversas, assim como os ecos que imprensa e rádio depois nos propõem. Ora as entrevistas que têm passado nas televisões generalistas têm suscitado muitas críticas. Por razões ligadas às formas de tratamento adotadas pelos entrevistadores e, por vezes, pelos próprios convidados. Por se considerar que, em muitos casos, os jornalistas são de uma intolerável agressividade. Porque o entrevistador se permite demasiadas vezes interromper o convidado, impedindo-o de concluir a sua resposta ou argumentação. Mas até porque a entrevista redunda repetidas vezes num pugilato em que as duas partes falam ao mesmo tempo. Para não falar no facto bem real de ver entrevistadores passarem

Um rafeiro rosnador

J.-M. Nobre-Correia A emissão da  Sic Notícias  de anteontem com Pedro Nuno Santos foi antes do mais um triste festival de incompetência e má educação… A benevolência de amigos de  Facebook  levou alguns a insistir para que eu visse a entrevista do ministro das Infraestrutura e da Habitação de anteontem, ao fim do dia, na  Sic Notícias . Até porque a dita entrevista constitui “um must”, escreve um, e é um “excelente case study [para] os cursos de jornalismo”, segundo outro. Ora, como já tive ocasião de escrever aqui, não sou nada amador de “emissões de palavreado”, sobretudo “à portuguesa”: insuficientemente preparadas, com pessoas a falarem ao mesmo tempo e detentores da carteira de jornalista a interromperem constantemente o entrevistado, procurando mostrar que sabem mais do que ele. Por outro lado, vivendo em Portugal há poucos anos, o facto de ter descoberto um dia que um estipendiário da  Sic  tivera a lata de publicar um livro intitulado  O meu programa de governo  (é mesmo caso

Insuficiências de uma entrevista

J.-M. Nobre-Correia A emissão de ontem com o atual presidente da República pôs uma vez mais em evidência algumas tristezas do jornalismo português… Uma confissão se impõe: desde que regressei a Portugal, vejo ultra-ultra-raramente nas televisões nacionais aquilo que chamo “emissões de palavreado”. Por uma questão de higiene mental e para não perder tempo com o que raramente vale a pena. Mas houve quem chamasse a minha atenção para duas emissões de ontem na  Sic Notícias , pelo que acabo de ver a entrevista de Marcelo Rebelo de Sousa. A dita entrevista reforçou o meu sentimento de que estas emissões são geralmente uma perda de tempo. E que são tecnicamente detestáveis, com hábitos que se criaram no jornalismo português que não são aceitáveis em termos europeus de jornalismo de qualidade. Primeiro reparo: o entrevistado estava ali como candidato às próximas eleições presidenciais. Não deveria pois ser tratado por “Senhor Presidente” mas sim por “Marcelo Rebelo de Sousa”, por extenso, par

Duas estranhas práticas

  J.-M. Nobre-Correia Ver um telejornal em Portugal é assistir a particularidades incompreensíveis à luz do melhor jornalismo europeu… Há nos telejornais portugueses práticas particularmente estranhas e absolutamente intoleráveis em termos jornalísticos. Uma dessas práticas é a que consiste em fazer dos diretores de jornais “comentadores” dos telejornais. Sobre matérias bastante diversas, como é aliás hábito num jornalismo português em que os “tudólogos” são legião. Quando se é promovido a diretor de jornal (de preferência diário), passa-se automaticamente a “comentador” [ 1 ] ! Com uma perspetiva de futuro clássica e terrivelmente caricatural: quando se deixa de ser diretor, deixa-se automaticamente de ser “comentador” de telejornal! Passe o Leitor em revista os sucessivos diretores dos diários ditos “nacionais” e verão que é bem assim. Qual será a verdadeira explicação para tal “promoção” televisiva dos diretores de jornais? Tentar a estação de televisão estabelecer relações instituc

Dignidade e coragem

Dizer que a diretora do Serviços de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) se demite nove meses depois do assassinato de um imigrante ucraniano no aeroporto de Lisboa, merece pelo menos um comentário: triste país onde nunca há pressa na tomada de decisões que o dignifiquem aos olhos dos estrangeiros e dos seus próprios cidadãos!… Triste país onde os chamados “brandos costumes” revelam sobretudo falta de dignidade e de coragem!…

Assim vamos andando…

  J.-M. Nobre-Correia Deixem-me que lhes diga duas coisas a propósito do que se passa atualmente no meio televisivo português. Primeiro: se as televisões generalistas privadas procederam como procederam estes dias em termos de programação, no seguimento da morte de uma jovem num acidente de viação, só porque a jovem tinha como origem uma família ligada à música popular, é porque os legisladores e os antecessores da ERC não tiveram a lucidez prospetiva e a coragem de estabelecer previamente, antes da atribuição das licenças de emissão às ditas televisões, cadernos de encargos suficientemente precisos de modo a impedir tal tipo de derrapagens, derrapagens aliás bastante frequentes, embora tomando aspetos diferentes. Mas é também porque, atualmente, a ERC continua a preferir quase sempre uma atuação que não “faz ondas”, pelo que os média faltosos continuam a fazer o que lhes dá na real gana… Segundo: o meu conhecimento das televisões europeias e mais particularmente das televisões belgas,

A versão séria de "Charlie Hebdo"

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J.-M. Nobre-Correia Quem nunca leu  Charlie Hebdo , tem do semanário francês a ideia de um jornal satírio, irreverente, anticlerical e um pouco anarca. É, na melhor das hipóteses, aquilo que dizem os média nacionais. E tudo isso é de facto verdade. Mas  Charlie Hebdo  é mais do que isso: nas suas 16 páginas semanais, para além dos desenhos humorísticos largamente presentes, há toda uma série de textos que são muitas vezes reflexões interessantes sobre a sociedade e o tempo que vivemos.  Alguns dos seus cronistas têm nomeada na área que é a deles: caso de Jean-Yves Camus, por exemplo, especialista dos movimentos de extrema-direita. Como era o caso do economista Bernard Maris, vítima do atentado de 7 de janeiro de 2015. No número datado de 2 de dezembro (…comprado hoje), este artigo sobre a evolução do jornalismo estado-unidense e, mais geralmente, anglo-saxónico: preocupante…  

Recordando a Saint-Nicolas

  J.-M. Nobre-Correia No decorrer dos anos, consegui reagrupar as aulas das minhas três cadeiras teóricas nas tardes das segundas e das terças-feiras dos dois semestres. O que permitia passar eventualmente o resto dos dias da semana por essa Europa fora e até mesmo vir a Portugal. As minhas aulas teóricas tinham fama de se desenrolarem sem barulho, sem confusão, sendo a tranquilidade e o silêncio interrompidos apenas pelas intervenções dos estudantes e pelas minhas, claro. Aulas que contavam sempre com a presença de mais de uma centena de estudantes, quando a assistência a aulas teóricas nem sequer era obrigatória. O que explicava que as eleições para a delegação estudante no Conselho de Departamento fossem anualmente organizadas no início de uma das minhas aulas de duas horas, durante uns 15-20 minutos. Como explicava que a pequena festividade da Saint-Nicolas irrompesse anualmente numa das minhas aulas, nos primeiros minutos do dia mais próximo de 6 de dezembro. Entrava então majesto

Um princípio de base esquecido

J.-M. Nobre-Correia Quando leio aquilo que leio nos jornais portugueses (eu que sou, por prazer e “dever”, assinante e leitor diário de jornais europeus, haverá no próximo mês 54 anos), deixem-me que faça aqui referência a um princípio de base. E o princípio é este: um jornal é uma instituição com uma indispensável coluna vertebral e não um “albergue espanhol” onde qualquer “colunista” (permanente ou ocasional) vem expor os seus delírios e os seus fantasmas obsessivos. É um erro magistral que praticamente todos os jornais em Portugal têm cometido desde o 25 de Abril. O que impossibilita os leitores de se identificarem com o “seu” jornal e de experimentarem quotidianamente a necessidade de comungarem com ele os factos de atualidade sobre a vida no mundo…  

Começa o folhetim da nova campanha

  J.-M. Nobre-Correia Quase ininterruptamente, os média, sobretudo as televisões, lançam peças mais ou menos alarmistas, pouco dignas do jornalismo… Desde que vivo em Portugal que experimento cada vez mais o horrível sentimento de que as redações dos média foram largamente invadidas por gente que nunca frequentou verdadeiras escola de jornalismo, mas sim escolas de relações públicas, de animação social ou de propaganda. Isto explica que os média “nacionais”, pequenos ou grandes, vão de campanha em campanha em campanha: ontem começou a do calendário da vacina anti-covid… Sem se preocuparem com o rigor da informação, sem verificarem previamente os factos, sem os fazerem interpretar por especialistas realmente conceituados. Dando a prioridade ao imediatismo e ao anúncio antes dos concorrentes, assim como às matérias suscetíveis de exaltar os ânimos do público. Privilegiando o clamor que o que anunciam poderá provocar, a repercussão que isso poderá ter nos outros média (que em princípio ci

Já repararam?…

J.-M. Nobre-Correia Pelas bandas do Facebook, não vi desde ontem uma única intervenção em favor da posição adotada pelo Bloco de Esquerda na Assembleia da República durante o debate final sobre o Orçamento de Estado para 2021. Mas vi muitíssimas a criticar a dita posição… Estará o meu Facebook desfasado em relação à realidade da chamada opinião pública? Ou o que se lê desde ontem no Facebook traduz de facto a perceção dos cidadãos deste país perante a atitude do Bloco de Esquerda?… Esperemos pelas próximas sondagens e sobretudo pelas próximas eleições: veremos então qual é o resultado da cartada de póquer de ontem…  

Um rio de incongruências

J.-M. Nobre-Correia As obsessões obscurantistas de um aliado de quem já deu suficientes provas de ser claramente inimigo da democracia… Ver Rui Rio no telejornal das 20h00 da RTP 1 denunciar as negociações entre PS e PCP, e pretender que o governo ficou dependente dos comunistas, provocou-me um calafrio seguido de riso… Só lhe faltou dizer que é bem sabido que os comunistas trazem uma faca entre os dentes e comem criancinhas ao pequeno almoço!!! Discurso bem conhecido de tempos de salazarismo, analfabetismo e repressão policial… Francamente: Rio que negociou e anda a negociar com o fascista de serviço, deveria ter o bom senso e a decência de se calar e não procurar meter-nos medo com o papão comunista. Até porque nós sabemos bem que, hoje em dia, o perigo potencial para a democracia portuguesa vem da gentalha reunida em torno do antigo militante do PSD e seu atual aliado, e não de um partido que soube resistir ao salazarismo e lutou pela instauração da democracia em Portugal. Um partid

O teatro do Bloco

  J.-M. Nobre-Correia Quando um partido confunde ação política com desempenho de uma peça num palco chamado parlamento ou televisão… Viram o que aconteceu hoje com o voto do Orçamento de Estado na Assembleia da República? Se querem compreender um dos aspetos, não se esqueçam que Catarina Martins é atriz. E o que ela anda a fazer há anos, na Assembleia da República e nos média (sobretudo perante as câmaras de televisão), é antes do mais teatro. Um muito mau teatro, diga-se em abono da verdade, com lados bastante irritantes de pretensa prima donna e preocupantes incidências sobre o futuro da esquerda e da democracia em Portugal. Desta vez, o seu partido — que conta outros protagonistas em matéria de teatro — resolveu apostar lançando a moedinha ao ar: caras ou cruzes? Vai o Bloco conseguir apanhar eleitores tradicionais do PS (que consideram que este não é suficientemente reformista) e/ou do PCP (estimando que este não é suficientemente radical)?; ou vai o Bloco entrar em fase de erosão

O que de facto está em jogo…

  J.-M. Nobre-Correia As discussões e decisões em torno do Orçamento de Estado, em tempos de pandemia, põem a questão do futuro da esquerda deste país… Observando-o com olhos de quem viu e continua a ver o que se passa na cena política europeia, o Bloco de Esquerda assemelha-se muito, por vezes, a uma agremiação de extraterrestres. Com manifestamente alguns espíritos brilhantes. E com outros egocêntricos exibicionistas palradores adoradores dos média. Mas com notórias graves deficiências em termos sociopolíticos: uma quase ausência nos planos autárquico, sindical e demais corpos intermédios de toda a espécie. E uma manifesta ausência de vontade de meter as mãos na massa, saltando decididamente dos discursos de tribuna para a gestão quotidiana de realidades comezinhas. Tudo isto se tornou particularmente flagrante desde que vivemos em pandemia, já lá vão nove meses. E perante esta pandemia vivida dolorosamente pela população, o Bloco vai de efeitos oratórios parlamentares em efeitos ora

Uma estranha "carta aberta"

  J.-M. Nobre-Correia Por razões deontológicas, sempre me proibi sugerir publicamente a jornalistas assuntos a tratar. Faço hoje uma exceção à regra que me impus há quase cinquenta anos. E permito-me assim propor aos jornalistas e média generalistas portugueses que procurem saber 1. quais (ex-)bastonários da Ordem dos Médicos reagiram publicamente à recusa de hospitais privados em receberem doentes da covid-19 e até ao encerramento decidido por alguns deles nos primeiros meses da vaga de pandemia? 2. quais (ex-)bastonários da dita Ordem do Médicos dirigem atualmente empresas privadas do sector médico ou têm atividades profissionais em clínicas e hospitais privados? Compreenderemos assim muito melhor o sentido do “alerta público” publicado hoje no  Público  por nada menos de seis (ex-)bastonários, “quase oito meses depois da pandemia covid-19 ter entrado em Portugal”, como eles próprios fazem reparar. Até porque não vi confrades deles tomarem idênticas iniciativas nos jornais de referên

Uma iniciativa magnífica

J.-M. Nobre-Correia Diamantino Gonçalves está a realizar um trabalho que ficará certamente como um contributo essencial para a história local… O Fundão de hoje corresponde pouquíssimo à recordação que eu tinha da minha terra, da terra onde nasci. Mas é possível, acredito, que, durante longos decénios, eu tenha pintado o Fundão na minha memória com cores encantadoras que de facto não correspondiam ou correspondiam pouco à realidade de há uns 50 anos… Seja como for, o facto é, para mim, que a sociabilidade no Fundão morreu. Que uma certa dinâmica e um certo orgulho (justificado) morreram também. Que esta vila promovida a cidade está socialmente inerte, amorfa. E que, por conseguinte, tudo se passa hoje numa total indiferença, numa total letargia social… Vejamos um caso significativo: Diamantino Gonçalves, técnico de ótica ocular reconhecido, está a fazer, por iniciativa própria, um trabalho absolutamente excecional de levantamento fotográfico sistemático do matrimónio arquitetónico e urb

Estes tais outros "comentadores"

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  J.-M. Nobre-Correia Comparar os futeboleiros aos políticos? “Intolerável!”, dizem estes. Talvez não tanto. E significativo de uma situação… Foi um alarido nos bastidores doirados do poder. Ousarem compará-los a “comentadores” futeboleiros! O que essas más-línguas querem é acabar com a liberdade de expressão e desencadear uma nova fase da antipolítica, do antipartidos. Como se eles, militantes, mandatários públicos e mesmo altos dignitários do aparelho de Estado, não fossem capazes de análises políticas totalmente independentes!… Que má-fé, com efeito. Alguém viu os políticos “comentadores” irem com os cachecóis dos partidos ao pescoço? E alguém os viu a insultarem-se aos gritos? Aí está a prova que não se podem confundir os “comentadores” todos! Só que, no fundo, no fundo, a natureza do serviço prestado aos cidadãos é relativamente idêntica: levá-los a partilhar a fé no partido/clube e naquilo que representa. Possa embora haver umas divergenciazitas com a direção do partido/clube. E

A incerteza de uma aposta

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  J.-M. Nobre-Correia Lançado há duas semanas, o mais recente diário italiano constitui uma novidade editorial. Fará ele data na história ?… Nunca há certezas nesta matéria. Muito menos quando o projeto marca uma clara rotura em relação ao habitual. Até porque o potencial sucesso de um jornal depende sempre de uma série de fatores internos e externos. Em termos editoriais, de organização e de gestão, como de distribuição, de contexto sociocultural, de reação dos anunciantes e até de uma atualidade inesperada. O novo diário romano  Domani  (Amanhã), lançado fará amanhã duas semanas, constitui manifestamente uma incógnita. Uma enorme incógnita mesmo, tenha ele um financiamento inicial assegurado por Carlo De Benedetti, que doou 10 milhões de euros à sociedade de edição constituída para a circunstância. E, após a fase de lançamento, o capital da empresa será transferido para uma fundação encarregada de garantir a autonomia do jornal. A leitura dos primeiros 13 números de  Domani  põe em e

Dois exemplos vindos de Itália

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J.-M. Nobre-Correia Numa paisagem impressa e digital bastante prolífica, nasce um novo diário, partindo de algumas ideias inspiradoras… Há países onde, uns atrás dos outros, os jornais vão morrendo (em Portugal, por exemplo) e outros onde continuam a ser lançados novos jornais (na Itália, no caso em apreço). Nasceu assim ontem em Roma o novo diário  Domani  (Amanhã). E duas notas são a reter no editorial de apresentação. Diz a primeira: “Os jornais imparciais não existem, os honestos declaram as próprias preferências”. Contrariamente ao que pretendem todos os “grandes” jornais portugueses que se dizem independentes e pluralistas, e são no fim de contas  melting pots  (caldeirões, misturas) incapazes de afirmar opções claras em momentos decisivos da vida nacional ou dos tempos incertos que vivemos. E, por isso mesmo, bastante incapazes de suscitar adesão por parte de potenciais leitores e sobretudo de potenciais compradores. Diz outro parágrafo do editorial: “ Domani  nasce da

Um retrato ainda bastante habitual

J.-M. Nobre-Correia Numa sociedade corroída por clivagens sociais monstruosas e uma hipocrisia despreocupada, o combate cruel e determinado de uma mulher… Estes tempos de pandemia não são nada convidativos para assistir a espetáculos. Sejam eles em espaço fechado ou em recinto aberto. Só gente irresponsável aí vai de ânimo leve. Mas havia pelo menos três razões para ir ver  Ordem moral  de Mário Barroso, nas salas de cinema desde quinta-feira 10. A primeira: Mário Barroso é um amigo, antigo companheiro de exílio em Bruxelas. A segunda: imaginava que, dado o tema, devia falar-se do  Diário de Notícias  nos primeiros decénios do século XX e talvez até antes de isso. A terceira: dado o personagem central do filme, Maria Adelaide Coelho, filha do fundador do jornal, era inevitável que fosse também evocado o seu marido, Alfredo da Cunha, que deu o nome a uma das principais praças do meu Fundão, cidade que o viu nascer. À parte o título do filme, que me parece pouco imaginativo, pouco