A democracia vai mal…

J.-M. Nobre-Correia

Que num país essencial no concerto europeu como a França — com o que ela representa em termos históricos e culturais, mas também em termos geopolíticos no plano internacional atual — haja, segundo as estimativas dos resultados da segunda volta das eleições presidenciais de hoje,

• 28,20% de cidadãos que tenham decidido não ir sequer votar nesta segunda volta, quando se tratava no fim de contas de escolher realmente a forma de sistema político que dirigirá a França, entre uma democracia liberal (seja ela formal) e uma democratura iliberal,

• 41,20% de cidadãos que tenham decidido apesar de tudo votar por uma candidata néo-fascista, anunciadora de uma sociedade claramente autoritária e repressiva, ferozmente anti-União Europeia e velha aliada de personagens pouco recomendáveis como Viktor Orbán e Vladimir Putin,

• que a maior parte dos cidadãos dos departamentos e territórios do ultramar, maioritariamente não-“brancos”, de ascendência não-europeia, tenha votado maioritariamente por uma candidata xenófoba, racista, que obteve mesmo mais de 60% dos sufrágios na Guiana, na Martinica e na Guadalupe,

estes três dados factuais constituem provas suficientes de que a democracia francesa, e até mesmo a democracia “tout court”, vai mal, muito mal e até inquietantemente mal nesta nossa Europa…

Dias particularmente sombrios parecem pois anunciar-se: há por demais preocupantes indícios disso…

A inevitável recomposição das forças políticas francesas por ocasião das eleições legislativa de 12 e 19 de junho será determinante: os três grandes polos surgidos por ocasião destas presidenciais (extrema direita, centro direita e esquerda radical) sairão reforçados das legislativas? E de que estabilidade governamental poderá contar então a França após estas legislativas?…

No horizonte da cena democrática francesa, a probabilidade das incertezas parece ser bem maior do que a fragilidade das certezas…

  

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