As incertezas das novas eras
J.-M. Nobre-Correia
Jornais : O chamado “quarto poder” tem fragilidades geralmente desconhecidas e às
quais não se presta suficientemente atenção. Com os riscos que isso pode
comportar…
É
o que acontece a maior parte das vezes. Nem sempre. Mas a maior parte das
vezes. Quando, numa empresa editora de médias, novos acionistas dão entrada no
capital. Ou quando novas direções editoriais entram em funções. A tentação é
grande, no primeiro caso, de querer nomear novos responsáveis para os lugares
chave da empresa. E, no segundo, de proceder a mudanças nas diferentes chefias
da redação e da programação, mas também no visual do média, na grelha da
programação e na conceção da informação como do jornal.
Para
os novos chefes, trata-se de facto de afirmar o início de uma “nova era”.
Porque, na cabeça deles é disso que se trata, com um antes e um depois. Só que,
em matéria de média, as audiências perdem-se mais depressa do que se ganham.
Porque o público é particularmente conservador. Sobretudo o público dos
jornais, distinguindo-se estes globalmente dos outros média pela atitude ativa
que requerem para o ato de compra.
Os
leitores de um jornal estão habituados a uma seleção da informação, a uma
hierarquização, a uma política de titulação e de ilustração, e que tal tipo de
matéria seja tratado por este ou aquele jornalista ou colaborador exterior. E
quando se procedem a modificações importantes, o leitor sente que perdeu a
ligação familiar que tinha com o “seu” jornal. Enquanto que os não leitores
mantêm uma imagem negativa tenaz daquele jornal, de que não gostam, que os
indispõe, pela razões mais diversas, sobretudo de ordem ideológica e digamos
cultural.
Um
jornal impresso e até um jornal digital são de facto produtos frágeis. Pelo que
há que os fazer evoluir lentamente, progressivamente, pincelada após pincelada.
De modo a procurar antes do mais conservar os fiéis leitores. Enquanto que, aos
poucos, pela qualidade da informação e das análises, pelos exclusivos que
conseguirá trazer a público, o jornal da tal “nova era” ir-se-á impondo nos
meios alvo para os quais é concebido. Tornando a sua leitura obrigatória,
condição indispensável de perenidade e de sucesso…
Texto publicado no Diário de Notícias, Lisboa, 30 de agosto de 2014, p. 43.