Do ativismo à prisão, à deserção e ao exílio

A evocação da guerra colonial, da chamada “guerra no Ultramar”, continua a ter aspetos raramente abordados e que são por vezes até mesmo apagados da memória coletiva. Pouco se fala deles nas conversas em sociedade. E jornais, revistas e livros pouca atenção prestam a tais temas.
Há por aí, pelo país fora, monumentos e lápides que recordam aqueles que participaram na guerra colonial e os que, numerosos, faleceram vítimas desta mesma guerra. Mas quem recorda os que se sentiram forçados ao exílio, empurrados para fora do seu país?…
Sabia-se desde o início que a guerra nas colónias estava irremediavelmente perdida e seria inevitavelmente inglória. Porque o movimento geral de reivindicação da independência por povos colonizados começara há largos anos. Porque grandes potências mundiais tinham já abandonado ou estavam a abandonar as suas antigas colónias. Não era pois Portugal, com os seus meios humanos, técnicos e económicos reduzidos que iria poder manter-se em territórios dispersos por três continentes. E isto quando o país vivia em ditadura há mais de trinta anos e que o povo português não fora sequer consultado sobre o tema da independência ou da continuação da guerra.
Em tal contexto, a grande maioria dos jovens prestou serviço militar e foi provavelmente para a guerra só porque não teve escolha possível: nem os conhecimentos, nem os relacionamentos, nem os meios financeiros, nem a situação familiar que lhe permitissem fazer outra escolha. E houve quem graças a relações sociais “altamente colocadas” tenha conseguido não ir para as colónias ou ficar comodamente instalado ao abrigo nas capitais das ditas colónias. Como houve quem tenha inacreditavelmente comprado o tempo de serviço militar nas colónias, pagando a outros para irem em vez deles. Duas situações escandalosas rarissimamente evocadas, porque os que usufruíram de tais benesses faziam e fazem quase sempre parte da “boa sociedade” portuguesa.
Houve depois os que disseram “não!”, pelas mais diversas razões. E entre eles os refratários e os desertores, que escolheram sair de Portugal e partir para um exílio de que desconheciam qual seria a duração. Uma escolha que, contrariamente ao que muitos pensam, quase sempre foi muito difícil e extremamente dolorosa. É disso que fala o meu amigo Sérgio Palma Brito no livro que acaba de publicar: Memórias de um desertor, Edições Colibri. Nele fala da vida social, académica e política nos anos 1960, sob a ditadura, no Alentejo e em Lisboa, da sua incorporação na 1a Companhia Disciplinar, em Penamacor, e da sua deserção para Bruxelas. Um livro a ler por quem quiser melhor conhecer realidades demasiado esquecidas, mas que foram componentes essenciais para compreender os anos 1960-70 do salazarismo, do colonialismo e do exílio portugueses…

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