Nova entrevista sobre o meu recente livro

1-Qual a ideia que esteve na origem deste livro «Teoria da Informação Jornalística?

R-Durante 31 anos, dei a estudantes de Ciências da Informação e da Comunicação, na Université Libre de Bruxelles, uma matéria que mudou duas vezes de nome e que acabou por se intitular Teoria da Informação Jornalística. Como apoio às exposições orais desta matéria, publiquei um manual (Théorie de l’Information Journalistique) que teve 21 edições diferentes e várias reimpressões. Manual que alguns amigos portugueses me propuseram mais de uma vez que eu o publicasse em Portugal. Mas eu nunca tive a disponibilidade de tempo necessária para me ocupar de uma edição em português…

Regressado a Portugal, após mais de 45 anos de residência em Bruxelas, resolvi ocupar-me eu próprio da tradução e da devida adaptação : não se trata pois exatamente do mesmo livro, a edição em francês sendo bastante mais extensa. E decidi fazê-lo porque penso que não há livro nenhum do mesmo género publicado em português e tendo como autor um português. Há é verdade vários livros (não muitos) de caráter mais técnico, mais pontual. Pelo que, no ensino superior como nos meios mediáticos, se recorre então a edições brasileiras, por vezes espanholas ou anglo-americanas, com que isto poderá ter de insatisfatório. E o mesmo são obrigados a fazer os cidadãos portugueses que se interrogam sobre a evolução atual dos média e da informação jornalística.

Por fim, achei que, sair de uma abordagem puramente portuguesa e propor uma perspetiva europeia do tema, não seria desprovido de interesse : os leitores di-lo-ão…

2-Para quem há tantos anos estuda o Jornalismo, como analisa agora o tempo das "fake news"?

R- Sempre houve notícias falsas na história dos média, desde o nascimento da imprensa. Notícias voluntariamente falsas : por iniciativa dos média, para fazer vender papel ou aumentar audiências ; ou por iniciativa de meios exteriores aos média, para lançar descrédito sobre concorrentes, por exemplo. Ou notícias involuntariamente falsas : por incompetência ou/e precipitação dos média, para procurar anunciar um facto antes dos concorrentes, para ter uma “exclusividade”.

O que mudou radicalmente é o facto de, com a internet, os antigos recetores (leitores, ouvintes, espectadores) passarem a poder ser também emissores. Pelo que somos inundados de informações que têm por origem os meios jornalísticos (que em princípio respeitam um certo número de princípios técnicos e deontológicos), mas também por outras de origem conhecida ou perfeitamente anónima e que, na grande maioria dos casos, nada têm de jornalístico.

Ora, os meios dirigentes como os meios minoritários sempre procuraram influenciar os média e a prática jornalística, a maneira como os média dão conta da atualidade e a interpretam. Com a internet, a partir da segunda metade dos anos 1990, esses mesmos meios deixaram de ter obrigatoriamente que passar pelos jornalistas e pelos média tradicionais : passaram eles mesmos a emitir toda a espécie de notícias verdadeiras, aproximativas ou falsas.

Há um ditado que tem aspetos horríveis e que diz “não há fumo sem fogo”. Pelo que as notícias desprovidas de factualidade, de veracidade, deixam sempre um certo rasto de credibilidade ou pelo menos de dúvida. E como, com a internet e as chamadas “redes sociais” passou a haver milhões e milhões de emissores de notícias, passámos a ter de praticar mais do que nunca um sentido crítico particularmente agudo em relação às notícias a que temos acesso.

3-Pensando no futuro: ainda vamos a tempo de refundar o jornalismo e fazer dele uma peça essencial na vida das pessoas no século XXI?

R-O jornalismo no sentido mais autêntico e forte da palavra é cada vez mais necessário, dada a gigantesca proliferação dos média a que assistimos desde os anos 1960-1970 e sobretudo desde os anos 1990-2000. Para melhor gerirmos as nossas próprias vidas e melhor nos inserirmos na sociedade em que vivemos, todos nós temos cada vez mais necessidade de rigor na recolha, na hierarquização e no tratamento dos factos, assim como de uma mais valia exigente na interpretação e na análise destes factos.


Texto publicado na revista digital Novos Livros, Rio Tinto, 21 de outubro de 2018.

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