Estamos tristemente assim

J.-M. Nobre-Correia

Faço uma ida e volta até à que chamo “a capital do império” (porque muitos dos seus naturais ainda estão convencidos que assim é). Desço na estação de Lisboa Oriente e entro no primeiro carro da fila de táxis.

Tínhamos andado apenas uns dez metros quando oiço a motorista dizer: “oh pá!, se pusesses os piscas-piscas era melhor !”. E de acrescentar depois para mim: “estes tipos vêm de lá onde não há regras e pensam que aqui é o mesmo!”. Digo que não reparei no que acontecera. E ela: “era um chamusca”…

Achei muito estranho que a motorista pudesse dizer que se tratava de alguém da Chamusca, dado que as placas dos automóveis em Portugal não permitem saber a origem geográfica do proprietário, contrariamente ao que acontece em França ou na Suíça, por exemplo.

O meu mal-entendido foi porém rapidamente esclarecido pela motorista: “estes chamuças vêm para aqui, mas não querem trabalhar. Só querem tirar proveito das nossas regalias sociais”.

Vejo-me então naturalmente levado a dizer: “olhe que eu vivi mais de 45 anos no estrangeiro e nunca vi ninguém emigrar apenas para tirar proveito das regalias sociais do país de acolhimento”. Mas a motorista tinha manifestamente a resposta na ponta da língua: “isso devia então ser nesse país” (mas não me perguntou qual era). “Mas vá ao centro de Lisboa e logo verá!”

Respondi-lhe que eu conhecia o centro de Lisboa. E que se estava a referir-se ao Martim Moniz, de que tanto se falara nestes últimos dias, eu não via onde estava o problema…

O resto da viagem passou-se em silêncio. E a motorista não teve uma palavra para despedir-se do cliente. Um cliente que ia precisamente para um almoço-encontro de antigos exilados em Bruxelas e Paris. E que foi tristemente pensando neste Portugal em que, vai para 50 anos, os europeus, sobretudo os europeus de esquerda, depositaram tantas esperanças, e em que a mentalidade fascistoide vai ganhando furiosamente terreno. Contando para isso com a colaboração diária, inconsciente e irresponsável, dos média dominantes…

 

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