Decisões a contracorrente

J.-M. Nobre-Correia
O Global Média reduz salário e horário dos redatores do Diário de Notícias: é isso que vai melhorar a situação do jornal?…
Com raríssimas exceções, os editores de jornais fazem sempre uma muito má aposta quando reduzem o número de jornalistas de uma redação e os meios de que dispõem os ditos jornalistas para produzirem boa informação. Para recolher factos e opiniões de atualidade, verificá-los, contextualizá-los, interpretá-los e propor análises dos ditos factos e opiniões.
Isto porque, com a ressalva das raríssimas exceções (jornais onde a abundância de jornalistas e de meios é manifesta, onde há gente que já nada produz e um evidente esbanjar de dinheiro), a redução de gente e de meios repercute-se sempre no conteúdo dos jornais.
Desde logo, assiste-se naturalmente a uma vaga de leitores que vai deixando de ler e de comprar o jornal. Porque o jornal tem menos páginas e menos a ler, porque desapareceu tal rubrica ou matéria especializada particularmente apreciada, porque deixou de escrever tal jornalista ou tal colaborador de que se gostava especialmente…
Esta realidade foi compreendida por muitos editores, sobretudo desde que o mundo dos média passou a ser particularmente prolífero e diversificado, e a concorrência mais assanhada. Pelo que a exigência dos leitores em relação ao conteúdo dos jornais é cada vez maior. O que leva diários como o britânico Financial Times ou o francês Le Monde a reforçar fortemente as suas redações em termos quantitativos como de competências: no início dos anos 2000, Le Monde contava apenas uns 300 jornalistas, hoje conta 450 (quer dizer 50 % mais)!
Há, pois, que recear que as decisões que acabam de ser tomadas com o Diário de Notícias sejam precisamente as piores. A perda de qualidade do jornal passará a ser ainda mais evidente. O que levará a uma perda de interesse por parte de leitores potenciais como de leitores tradicionais do jornal. A não ser, claro, que a administração, após esta sangria, se proponha reforçar substancialmente a redação com elementos de manifesta melhor qualidade…
Sabemos, com efeito, por exemplo, que um modesto diário como o francês Libération (73 963 exemplares de difusão) conta atualmente 183 jornalistas para uma publicação em papel seis dias na semana, mais um sítio em linha. E sabemos também que o Diário de Notícias contava apenas agora 34 jornalistas para fazerem uma edição semanal em papel, mais seis edições diárias em digital e um sítio em linha: a trágica situação desta velha instituição do mundo mediático português é pois por demais evidente…

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