Recordando a Saint-Nicolas

 J.-M. Nobre-Correia

No decorrer dos anos, consegui reagrupar as aulas das minhas três cadeiras teóricas nas tardes das segundas e das terças-feiras dos dois semestres. O que permitia passar eventualmente o resto dos dias da semana por essa Europa fora e até mesmo vir a Portugal.

As minhas aulas teóricas tinham fama de se desenrolarem sem barulho, sem confusão, sendo a tranquilidade e o silêncio interrompidos apenas pelas intervenções dos estudantes e pelas minhas, claro. Aulas que contavam sempre com a presença de mais de uma centena de estudantes, quando a assistência a aulas teóricas nem sequer era obrigatória. O que explicava que as eleições para a delegação estudante no Conselho de Departamento fossem anualmente organizadas no início de uma das minhas aulas de duas horas, durante uns 15-20 minutos. Como explicava que a pequena festividade da Saint-Nicolas irrompesse anualmente numa das minhas aulas, nos primeiros minutos do dia mais próximo de 6 de dezembro.

Entrava então majestoso um estudante vestido de Saint Nicolas, acompanhado pelo seu séquito e nomeadamente pelo Père Fouettard (o Papão, diz o dicionário. O castigador): aplausos no anfiteatro! Após um breve bonjour les enfants (bom dia meninos), e um bonjour Monsieur le Professeur (bom dia Senhor Professor), Saint-Nicolas dirigia-se então a mim perguntando si les enfants avaient été sages pendant l’année (se os meninos se tinham portado bem durante o ano). Pergunta à qual eu não tinha escolha possível e respondia evidentemente que sim, acompanhado em coro pelos presentes no anfiteatro: mais oui, mais oui (claro que sim, claro que sim)! Saint Nicolas e o seu séquito percorriam então as filas do anfiteatro distribuindo rebuçados …aos meninos que se tinham portado bem. Quer dizer: a todos!…

O 6 de dezembro deste ano calha este domingo. Seria pois na minha aula de segunda-feira que Saint Nicolas viria inquirir-se do comportamento dos meninos de licenciatura em Informação e Comunicação e distribuir guloseimas …aux enfants sages! Uma tradição muito viva, nas famílias como nas escolas, empresas e instituições, naquele …Plat Pays (que cantava Jacques Brel), onde estudei, ensinei e vivi a maior parte da minha vida. Naquele que é de facto o meu Outro País!…

 

Ilustração: o célebre bruxelês Manneken Pis (Menino que mija, de seu nome Julien) vestido de Saint-Nicolas.


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